Os professores brasileiros entre os 50 finalistas do Global Teacher Prize, o “Prêmio Nobel” da educação
Há três anos, a paulistana Débora Garofalo, de 39 anos, professora da rede pública desde os 26, reparou que seus alunos não iam à escola em dias de chuva por causa das enchentes – ocasionadas pelo excesso de lixo no bairro Vila Babilônia, na periferia da capital paulista. Resolveu então transformar suas aulas de Informática Educativa em oficinas de robótica usando sucata coletada pelos próprios estudantes entre os dejetos acumulados nas redondezas. Deu-se aí uma limpeza geral. O projeto mobilizou toda a comunidade e, em três anos, uma tonelada de material reciclável saiu das ruas e virou máquina de refrigerante, um pequeno helicóptero, até um carrinho automático que toca a música-tema de Frozen.
O pernambucano Jayse Ferreira, de 38 anos, puxou pela veia artística de seus alunos na pequena Itambé, cidade pernambucana na divisa com a Paraíba. Comovido com a paixão deles pela saga Harry Potter – e isso em uma cidade que nem cinema tem –, ele levou as aventuras do bruxinho britânico para dentro da sala de aula. Professor de arte do Ensino Médio, Ferreira produziu, junto com
com os estudantes, o curta-metragem Harry Potter, O Recomeço, obra que chegou a figurar na página oficial da saga. Animado, o grupo filmou outro curta, este baseado no jogo Minecraft. A turma também se envolveu em um ensaio fotográfico com roupas típicas de vários países do mundo. Em 2017, graças a uma parceria com um shopping em João Pessoa (a capital mais próxima), o professor levou os alunos ao cinema pela primeira vez.
Foi a combinação de originalidade e simplicidade, aliada aos bons resultados medidos no boletim dos alunos e na frequência escolar, que renderam a Débora e Ferreira um lugar entre os 50 professores finalistas da quinta edição do Global Teacher Prize, premiação promovida pela Fundação Varkey e considerada uma espécie de Prêmio Nobel da educação. Os dois professores brasileiros foram selecionados entre mais de 10 mil candidatos de 179 países. No ano passado, o paulista Diego Mahfouz, diretor da Escola Darcy Ribeiro, em São José do Rio Preto, ficou entre os 10 melhores. A vencedora foi a britânica Andrea Zafirakou, responsável por uma escola na periferia de Londres que acolhe refugiados e possui alunos de mais de 100 etnias.
“Passei por um grande teste de resistência, porque minha comunidade era muito machista”, disse Débora, à VEJA. “Não é comum ver uma mulher trabalhando com robótica. Tive que conquistar as meninas também, ensinar que podiam ser o que quiserem e, depois, conquistar a comunidade. Meus colegas aprovaram logo de cara, mas senti falta de parcerias”, explica a professora, que aprendeu programação sozinha, através de tutoriais na internet. O apoio maciço veio com a queda da evasão escolar. “São crianças que não têm nenhum acesso à tecnologia e descobriram o ouro quando se viram construindo seus próprios brinquedos”, comemora Débora. O objetivo, atualmente, é mostrar que sua ideia pode ser adotada em qualquer escola – um dos critérios do prêmio é justamente a reprodutibilidade dos projetos.
Para a produção do ensaio fotográfico e dos curta-metragem, Ferreira precisou, como sempre, driblar a falta de recursos – além de alguma resistência da escola. “A maioria é filho de cortador de cana, não posso pedir muito deles. O jeito é ir ao comércio atrás de contribuição de roupa, ir ao cabeleireiro conseguir maquiagem e penteados, enfim, envolver a comunidade inteira”, diz o professor, formado em arte e filosofia, que diz ter buscado inspiração em uma professora da faculdade. “Ela sempre me dizia: dê a aula que você gostaria de assistir. Por isso, pergunto sempre aos alunos do que eles gostam. Os professores estão acostumados com todo mundo quietinho e a minha sala de aula é barulhenta”, afirma.
O prêmio máximo do Global Teacher Prize é de 1 milhão de dólares. O vencedor será anunciado no Fórum Global de Educação e Habilidades, em Dubai, em 24 de março de 2019.